
Uma das mais antigas
povoações do sudoeste pernambucano é a vila de Cachoeira do Roberto, cujas
raízes históricas remontam ao princípio do século XIX, quando ali se
estabeleceu com seus rebanhos o agropecuarista piauiense e capitão da guarda
nacional Roberto Ramos da Silva.
Cachoeira era um
inculto terreno que pertencera primeiramente ao português Valério Coelho
Rodrigues, estabelecido na fazenda Paulista, hoje Paulistana, no Piauí, onde
faleceu em 1783. Depois, teria passado ao seu filho Estêvão Rodrigues Coelho
que, alguns anos depois, sem desenvolver qualquer atividade econômica no
imóvel, o vendeu ao referido Roberto Ramos por cinco contos de réis. Desde
então o adquirente estabeleceu-se com sua família e escravos no lugar,
assentando a caiçara de seus currais e desenvolvendo laborioso trabalho de
agricultura e pecuária. Porém, com seu rebanho já em número avantajado passou a
enfrentar dificuldades com a escassez de água e pastagens em face das
constantes estiagens que ainda hoje afligem aquela região do semiárido
nordestino. Consta que era católico fervoroso e, segundo a tradição, em pagamento
de promessa pela mantença de seu rebanho, em 1817 construiu em frente à sua
residência uma capela sob a invocação de Nossa Senhora das Dores, santa de sua
devoção. Também, deu início à tradicional festa do Divino Espírito Santo. Para o primeiro empreendimento contou com o
concurso de Fr. Ângelo Maurício de Niza, missionário capuchinho italiano, que
desde 1803 catequizava em missões pelo alto sertão, terminando os seus dias em
1824, no aldeamento da Baixa Verde, hoje cidade de Triunfo, em Pernambuco, conforme
anotou o festejado historiador F. A. Pereira da Costa em seus Anais Pernambucanos(vol. 5, p. 568/569).
Desde então, o padre em desobriga passou a celebrar a missa e desenvolver as
atividades católicas no novo templo que, inclusive, serviu de sede paroquial
entre os anos de 1867 e 1870. E o lugar ficou conhecido por “Cachoeira do
Roberto”, em homenagem ao seu proprietário e fundador.
Depois de seu óbito
foi sucedido na administração e conservação do templo, bem como na organização
da festa do Divino, por sua filha Ana Maria, que, juntamente com o esposo, José
Santana, tomaram para si essa responsabilidade, tornando-se benfeitores do
lugar.
O capitão Roberto
Ramos da Silva, também conhecido por “Roberto da Cachoeira”, era natural da
cidade de Oeiras, então capital da capitania de S. José do Piauí, sendo filho
do português Jorge Ramos, fazendeiro e funcionário do real serviço, e de sua
esposa Delfina Rodrigues Seabra, que ao lado de Fr. Henrique, capuchinho
italiano, construiu o cemitério de Cachoeira do Roberto, sendo, porém,
sepultada no altar-mor da referida capela de Nossa Senhora das Dores, quando
faleceu aos 105 anos de idade. Consta que Roberto da Cachoeira fez-se
latifundiário construindo invejável patrimônio que, posteriormente, foi
dividido entre seus 16 filhos.
A povoação possuía
localização privilegiada, situando-se entre os rios Pontal e S. Francisco, à
margem da antiga estrada real, onde demandavam os viandantes, vaqueiros,
tropeiros e boiadas no percurso entre os sertões do Piauí, Pernambuco e Bahia.
Por essa razão, “era muito frequentada
pelos viandantes, que estacionavam na localidade, pelos recursos que
proporcionava, vindo daí o seu desenvolvimento e sua importância”, anotou o
citado F. A. Pereira da Costa, primeiro escritor a narrar a fundação e
desenvolvimento do lugar. Acrescenta o mesmo autor: “Muito habitada, ela teve vida própria e animada pelo seu movimento
comercial, com uma boa feira semanal, e um clima ameno e agradável,
proporcionando excelente e abundante água potável, com a sua capelinha curada e
um cemitério em conveniente situação, já teve a povoação o predicamento de
paróquia com a remoção da sede da do Senhor Bom Jesus da Igreja Nova, ou Boa
Vista, em virtude da Lei Provincial n.º 758 de 5 de julho de 1867 e servindo de
igreja matriz a sua capela de N. S. das Dores, e depois da de Santa Maria
Rainha dos Anjos de Petrolina, até que foi transferida para a sua própria sede
pela Lei Provincial n.º 921 de 18 de maio de 1870” (op. cit).
Em face dessa
vantajosa posição, em 1851 a sede de fazenda já se tornara um povoado próspero
e prometedor, progredindo ao ponto de, em 1868, contar com cerca de 80 casas,
informa F. A. Pereira da Costa (Anais
Pernambucanos. vol. 5, p. 568/569). Pertencia originalmente ao Distrito de
Santa Maria da Boa Vista, depois cidade e município de mesmo nome. Todavia,
pela Lei Provincial n.º 530, de 07 de junho de 1862, que criou o município de
Petrolina, passou a este, retornando para o município original pela Lei n.º
601, de 13 de maio de 1864, que extinguiu este último. Por fim, já como sede
distrital retornou a Petrolina pela Lei Provincial n.º 921, de 18 de maio de
1870, que restabeleceu sua autonomia administrativa. No entanto, conforme se
disse, em face de seu desenvolvimento foi elevado a sede distrital e paroquial
pela Lei Provincial n.º 758, de 05 de julho de 1867, permanecendo integrando o
Município de Petrolina e, como tal, permaneceu por largos anos.
Todavia, o progresso
da povoação estacionaria a partir de 1926, como efeito da construção da
inconclusa Estrada de Ferro Petrolina/Teresina que, ao invés de passar pela
tradicional vila de Cachoeira do Roberto, em novo traçado passou pela vizinha
fazenda “Inveja”, sucessivamente de Francisco Rodrigues da Silva e Francisco
Rodrigues Coelho. Então, esse novo lugar que, a partir de 1928 recebeu o nome
de São João de Afrânio, em homenagem ao Engenheiro Afrânio de Melo Franco, um
dos responsáveis pela obra, prosperou em prejuízo de Cachoeira do Roberto. Por
fim, essa decadência econômica se completaria com a edição do decreto-lei
estadual n.º 235, de 09 de dezembro de 1938, que extingue o distrito de
Cachoeira do Roberto, sendo seu território repartido entre os distritos de
Afrânio(ex-São João de Afrânio), Rajada e Poço da Anta.
E permanece a
povoação de Cachoeira do Roberto nessa situação decadente até a criação do novo
município de Afrânio, pela lei estadual n.º 4.983, de 20 de dezembro de 1963,
com instalação oficial em 31 de maio do ano seguinte. Então, nesse interregno,
pela lei municipal nº 28 de 23 de dezembro de 1963, é restabelecido o distrito
de Cachoeira do Roberto, não sendo, porém, instalado, o que só ocorre depois de
ser recriado pela Lei Municipal n.º 13-A, de 20 de outubro de 1967, agora com
novos limites territoriais e pertencente ao novo município, em cuja situação
permanece até à atualidade. Aos poucos a povoação retoma os caminhos do
progresso. Segundo o jovem historiador Ricardo de Araújo Rodrigues – que exerce
o magistério em Afrânio –, o distrito sobrevive da agricultura de subsistência,
pecuária extensiva, indústria cerâmica e comércio de gêneros alimentícios.
Atualmente possui 90 domicílios e 300 habitantes(IBGE – Censo, 2011) e possui
um cartório de registro civil das pessoas naturais.
Segundo informações que temos, a festa do
Divino Espírito Santo é muito tradicional em Cachoeira do Roberto, reunindo
grande número de fiéis no novenário que encerra-se no dia de “Pentencostes”,
com festas e quermesses.
No que se refere aos
16 filhos do capitão Roberto Ramos da Silva (Roberto da Cachoeira), sei apenas
que um de nome Roberto Ramos da Silva Filho, estabeleceu-se no vizinho
território de Casa Nova(BA), onde faleceu em avançada idade, no ano de 1934,
deixando descendência. Ao que sei a referida filha, Ana Maria Ramos, foi casada
com o fazendeiro José Santana, ao que parece descendente do português Valério
Coelho Rodrigues, gerando entre outros filhos: Francisco Martins Santana, que
foi casado com Domingas Santana e Bertolina Maria de Jesus, que foi casada com
José Marreiros. O primeiro casal gerou, entre outros filhos, meu bisavô Teodoro
Francisco Martins, que foi casado com sua prima Adriana Maria de Jesus(minha
bisavó), filha do segundo casal e que depois de viúva mudou-se para São João do
Piauí, onde faleceu em 19 de fevereiro de 1959, aos 92 anos de idade. Esses
últimos são os pais de treze filhos, entre esses minha avó paterna, Antonia
Maria da Conceição, nascida na Cachoeira do Roberto, em 1907, onde viveu sua
infância e juventude, casando-se na mencionada capela de Nossa Senhora das
Dores, em 07 de julho de 1925, com meu avô paterno Joaquim da Silva Brasil,
natural do arraial de Santa Rita, município de Casa Nova(BA), depois de alguns
anos passando ao sul do Piauí, onde faleceram.
Com essas notas
coligidas entre informações esparsas presto uma homenagem a esta antiga
povoação pernambucana, pela qual nutro simpatia em face de ser a terra de meus
avoengos e sobre a qual muito ouvi falar na meninice, na voz de meus
ancestrais.
Reginaldo Miranda
Presidente da Academia Piauiense de Letras
Blog Bruno Brito
Reginaldo Miranda
Presidente da Academia Piauiense de Letras
Blog Bruno Brito
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